sábado, 17 de janeiro de 2015

A delicada arte de viver

Esses dias assisti a um filme que muito mexeu comigo e que me fez chorar do inicio ao fim, não apenas algumas lágrimas perdidas, escondidas ou de emoção, mas lágrimas e choro de verdade.

Mas por que esse filme mexeu tanto assim comigo?

Tentando analisar, primeiro ele trata de um tema no qual penso muito: não é possivel que tudo corra sempre tão bem assim. Eh que na verdade não tenho graves problemas, ao contrário de pessoas que cruzo todos os dias que passam por uma doença grave, perderam uma pessoa importante ou passam por dificuldades financeiras. Mas a vida não pode ser sempre simples e fácil assim, pode? Um dia a roda da fortuna muda de lado, não é?

O filme começa dessa forma, com um casal que se ama, auto-suficiente, até que um acidente os separa...

O tempo passa, a mulher refaz a vida dela se concentrando no trabalho mas sem muita vida pessoal, até que ela encontra um colega de trabalho com quem se sente bem. Mas as pessoas ao seu redor não veem essa historia com bons olhos, ela tão bonita e o homem tão feio e "insignificante"!!!

Nunca fui bonita nem simpática, sempre vivi uma certa inadaptação social e não sabia direito o que fazer para ter amigos ou ter um amor correspondido. Até mesmo a minha avo me disse recentemente no telefone que eu parecia bonita nas fotos, eu que sempre fui tão feinha e sem graça!!!

Felizmente isso nunca me impediu de amar e ser amada algumas vezes de volta. 

Tive alguns amores não correspondidos, como o G, que povoou minhas fantasias durante boa parte da minha adolescência. Até o dia em que uma amiga contou que eu gostava dele, e a sua reação foi "Quem?" Realmente ele não sabia quem eu era, a tal amiga explicou em detalhes e ele respondeu "aquela gordinha?"

Depois teve o D, amor de verão durante anos a fio, mas a nossa historia nunca avançou, nunca evoluiu na "cidade grande". Eu poderia ter me perdido naqueles olhos verdes que fixavam o fundo da minha alma, mas a vida quis de outra forma.

Então apareceu o C, com quem realmente me senti amada, mas que assim como chegou na minha vida, cheio de amor, planos e projetos, desapareceu  2 anos depois.

Muita gente não acredita ou não acreditou nos meus sentimentos sinceros pelo O, afinal era tanta diferença de idade e de experiência de vida. Durante 2 anos vivi um sonho, mas quando fui obrigada a acordar vi que nada daquilo era verdade. Se tudo o que eu vivi foi uma grande decepção ou uma mentira, não posso reclamar, pois o mais importante é que ele esteve ao meu lado em um dos momentos mais dificeis da minha vida, quando minha mãe passou por uma cirugia importante e esteve muito ruim. Ele foi a minha força naquele momento e por isso não guardo rancores,n nem mágoas, e até consigo lembrar dele com um sorriso e desejo seu bem.

Eu poderia ter amado o C e vivido uma linda historia, mas eu nunca soube expressar meus sentimentos, tinha medo de dizer o que eu queria (um grande erro, aprendi mais tarde). Creio que o perdi porque ele achou que eu não queria nada sério, que soh queria curtir o momento. Quando percebi que dei bobeira já era muito tarde.

Mas então conheci o C E, que me trouxe tanta paz de espirito e com ele eu não me sentia nem inferior nem superior, lá estava eu em um momento da vida em que já não me preocupava tanto com os olhares dos outros. Aprendemos e vivemos muitas coisas juntos, como minha evolução profissional, minha primeira viagem internacional. Mas ele estava saindo de um longo problema de saude e esteve muito fechado para o mundo, acredito mesmo que fui sua primeira abertura apos muito tempo. Tendo em vista o meu passado, eu queria ir mais longe, não queria perder tempo, mas 3 anos de namoro e ele não estava pronto para "crescer". Para "seguir em frente" muitas vezes temos que deixar algumas pessoas para trás.

Nunca pensei em morar especialmente na Europa ou na França, mas queria aprender um outro idioma e entre o francês e o alemão, consegui um bom preço na Aliança Francesa e horários que coincidiam com o meu (pouco) tempo livre. Quando surgiu pela primeira vez a possibilidade de vir morar na França eu conversei com ele, um pouco na esperança de que ele me fizesse uma proposta mais interessante para eu ficar em Porto Alegre. Proposta essa que nunca veio. 

Será que se eu tivesse aprendido alemão hoje estaria morando na Alemanha e casada com um alemão?
(mais uma dessas questões que a gente se faz pela vida afora e que que ficará sem resposta)

De vez em quando acontece de me dizer que a hesitação dele mudou toda a minha vida. Mas agora me parece que se ele não tivesse tido esse ataque de pânico ai sim minha vida teria sido verdadeiramente transformada. 

Foi então que o Sylvain entrou na minha vida. E nunca mais voltei a morar no Brasil. Vou como turista, como vista, e me sinto estrangeira. Apesar de me considerar ainda psicologa nunca mais exerci diretamente a profissão (sempre fui atraida por numeros, tabelas, objetivos e metas), mesmo se ela está presente no meu quotidiano. Quando eu estudava matemática (bacharelado) na UFRGS era uma das piores aspirantes ao titulo de "matemático", mas fora desse circulo restrito as pessoas ficam surpresas com a minha facilidade para os numeros! Tudo depende do ponto de partida, não é verdade?

Muitas pessoas acreditam que a vida não é pré-determinada e que todas as historias são uma rede de coincidências. Porém esses mesmos que compartilham desta convicção, quando em algum momento de suas existências eles retornam para contemplar o passado, eles se dizem que todos os acontecimentos vividos foram inevitáveis.


Ah, falei tanto e não falei que filme foi esse que tanto mexeu comigo:

Se você quiser chorar até se sentir completamente libertada(o) de todas as lagrimas que estavam presas no mais profundo do seu ser, assista ao filme.

Ou vai ver você assistira (ou mesmo jah viu) e não sentiu nada... Vai saber ?

domingo, 11 de janeiro de 2015

Ataque terrorista na França: de vitima a vilão

Vocês sabem qual era a pauta da reunião do dia em que os jornalistas/ caricaturistas de Paris foram assassinados? "COMO COMBATER O RACISMO".


Fico chocada com os comentarios odiosos dos BRASILEIROS que tenho ouvido em relação ao jornal de satiras Charlie Hebdo. Fico realmente revoltada.
Anda circulando por ai uma caricatura de uma ministra francesa em macaco. A charge foi realmente realizada pelo Charb, MAS o que parece que os brasileiros não entenderam, por pegarem o bonde andando, é que ela foi uma RESPOSTA a uma publicação da extrema direita, essa sim considerada racista. Para quem vê a charge isolada, sem contexto, não entende a mensagem que ela passou na época. Ai estah o problema de pegar o bonde andando e querer sentar na janela!!! Não sou leitora da Charlie Hebdo (não tenho senso de humor nenhum, nem consigo entender direito humor francês), mas não acho justo sair julgando sem conhecimento de causa. Essa revista defende a liberdade e denuncia todos os extremismos, dentre eles o ISLAMISMO RADICAL.

Os brasileiros andam confundindo "denunciar os extremistos, os fanatismos" com "rir do oprimido". Se fosse um problema com a interpretação de um texto, eu diria que se trata de analfabetismo funcional, mas como se trata de charges, eu chamo de analfabetismo cultural.

Em uma entrevista logo apos a caricatura, Charb respondeu (a tradução é minha): "Quando "Minute" associa Taubira à imagem do macaco e da banana, nos caricaturamos Taubira para denunciar o racismo de "Minute". Alguns levavam o nosso desenho ao pé da letra. Minute é claramente de extrema-direita com toda a ideologia que vai com isso. Charlie Hebdo é um jornal engajado em ações anti-racistas. Para denunciar o racismo, é necessario as vezes representa-lo, ou pelo menos representar a imagem chocante que ele quer denunciar". (fonte: http://medialibre.info/face-a-faces/?tag=charb) .

Provavelmente os negros brasileiros que não vivenciaram o contexto se sentem ofendidos ao verem a charge nesse momento, mas vale lembrar que o contexto em que ela foi publicada na França era outro.

Como bem explicou o Luis Fernando Verissimo:
"O 'Charlie Hebdo'e outros, como o “Canard Enchainé”, pertencem a uma tradição de imprensa malcriada que vem desde antes da Revolução Francesa. É uma imprensa que não reconhece limites nem de alvos para o seu humor corrosivo nem de coisas vagas como 'bom gosto'. Jornais como o 'Charlie', impensáveis em qualquer outro lugar, se beneficiam de outra tradição francesa, a da tolerância com a contestação política e respeito à liberdade de expressão. "

Seu alvo principal é a direita cristã francesa, mas tem falado muito de outros assuntos, de todos os extremismos e fanatismos.

Morando aqui na França desde 2008, acompanhei de perto toda a polêmica na época. E sofri muito com os atos terroristas dos ultimos dias, inclusive o local onde o cumplice entrou e fez mais de 16 réfens (matando 4) na sexta-feira foi pertinho do meu local de trabalho e passei uma tarde de sexta horrivel, sem poder sair, sem saber o que poderia acontecer. Das 13h às 17h. Recebi centenas de telefonemas e mensagens de colegas franceses perguntando como eu estava e mostrando que "estavam comigo" naquele momento de sofrimento, mas NENHUM BRASILEIRO, nem do Brasil nem da França fizeram nenhum movimento nesse sentido. Parece que jah estavam mais preocupados em cumpabilizar as vitimas do que com a continuação dos atentados.  Muito triste.

Entendo que para a população brasileira esse tipo de publicação possa parecer chocante, pois no Brasil não se brinca com religião.

Mas o que esperar de uma sociedade que acredita que mulher com roupa provocante "merece" ser estuprada?

quinta-feira, 8 de janeiro de 2015

Atentado em Paris: entre liberdade, adaptação e escolhas

Ontem foi um dia muito triste aqui na França, os franceses estão horrorizados diante de tanto ódio e violência. 

Esse blog não é político e até evito de entrar nesse assunto por aqui para não ser mal-interpretada, mas a liberdade de imprensa, do humor e a liberdade por si só é sagrada! 

Tem sempre alguém que critica a França com base no seu passado colonial, mas há muito tempo se trata de um país de liberdade que acolhe refugiados do mundo inteiro. Ninguém aqui é impedido de exercer a sua religião, existem lugares de culto para tudo que é crença. 
Todo mundo tem direito à escola, as universidades são gratuitas, existe "bolsa-familia" e ajuda para tudo que é tipo de problema e dificuldade financeira. 

Em uma das escolas em que trabalha o meu marido (bem no centro de Paris e a alguns quarteirões do atentado), as crianças falam 60 linguas diferentes e recebem uma educação de muito boa qualidade.

Para muitos brasileiros que não vivem aqui na França talvez seja difícil de entender o posicionamento do tal Jornal, mas o que é bom saber é que não é imprensa sensacionalista, mas sim um jornal de qualidade, inteligente e muito respeitado. Mesmo se não concordo com tudo o que eles faziam (não tenho humor nenhum), felizmente ainda existem alguns jornais assim, pois imaginem de todo jornalista/desenhista/caricaturista/artista não dissessem o que pensam por medo de represálias?

Inclusive eu sempre insisto que muitas reportagens vindas de países extremistas são totalmente tendenciosas, pois justamente muitos jornalistas, por medo (ou falta de opção, vai saber), mostram apenas um lado da história, como criancinhas feridas gravemente ou mortas, para penalizar o mundo inteiro para a sua causa.

Estou aqui na França há 6 anos e posso dizer que como estrangeira nunca sofri nenhum tipo de discriminação direta. Isso nunca me impediu de estudar, de trabalhar, de ser promovida. 

Vejo tantos estrangeiros (ou filhos/netos de) que se vitimizam e se consideram discriminados por tudo. Uma colega afro-descendente repetia que não era promovida porque era negra, mas na verdade o trabalho dela era muito ruim, ela cometia erros básicos TODOS os dias e a chefia não podiam confiar nenhuma tarefa importante para ela, pois ou ela não fazia, ou fazia mal. Promover uma pessoa assim?

Igualmente uma outra colega de origem estrangeira (hoje ela tem a nacionalidade francesa, mas nasceu em outro país) se sente vitima de tudo e acha que as pessoas não gostam dela porque ela tem um sotaque muito forte. Mas ninguém gosta dela porque ela é fofoqueira, inventa história, e ainda chora e faz crise por tudo! Ela tem fama de "chata" e por isso ninguém a suporta, não tem nada a ver com o fato de ser estrangeira.

Muitos que chegam aqui, independente de onde vieram, se isolam, não aprendem a lingua corretamente e desta forma vivem às margens da sociedade. Outros, felizmente, se esforçam bastante a se incluirem nessa nova sociedade. Eh fundamental aprender a língua.

Entendo que para quem chega aqui adulto pode não ser nada fácil, mas então deve ao menos haver uma vontade de se integrar se eles realmente têm a intenção de viver aqui, e acima de tudo uma grande preocupação para que os filhos se integrem nessa sociedade e falem corretamente a língua.

Minha receita? Aprender a lingua, interessar-se pela cultura e história do país em que vivemos e evitar de viver fechada no meu mundinho, ou seja, abrir-se para os outros, independente da origem de cada um. Isso passa até por abrir a boca e provar tudo que é tipo de comida (posso participar de qualquer almoço de trabalho ou seminários na empresa, posso ir jantar na casa de amigos judeus ou muçulmanos, como muito bem nas casas dos franceses, posso ir a um restaurante vegan com amigos ecologistas e nem por isso sou menos gaúcha!), pois acreditem ou não a disparidade também passa pelo estômago!

E a melhor arma conta o preconceito, contra a exclusão e contra  a diferença é estudar. 

Entendo que em muitos países (inclusive no Brasil) estudar é um luxo ao qual poucos têm direito, mas não é o caso na França, então esses terroristas não têm desculpa nem nenhuma justificativa..

Ninguém tem o direito de realizar um atentado contra a expressão, contra a arte, a cultura, os risos, a vida.